É Mesmo? De primeira?


Bem no começo de carreira, lá pela 2ª ou 3ª gravação, ainda estava sob o impacto de uma frase aterradora: "se você não gravar tudo de primeira, o produtor vai te dar uma bronca e te mandar embora". Ou seja, "nervoso" era meu nome do meio.

Começamos a gravação, e eu comecei a gravar as músicas. Bem na 2ª música, errei um acorde, e segui  tocando até terminar, pois era uma gravação de base.

Quando terminamos, o maestro dispara: "alguém tem algum 'pecado' a confessar?"

O que eu faço? Fico quieto, deixo a coisa ir até o fim, foi um errinho bobo, acho que dava para passar sem perceber. Ou falo que errei, e vou arrumando as malas?

Decidi pela 2ª opção.

"Maestro, errei uma nota no meio da música. Posso arrumar?", perguntei já me preparando para enrolar o cabo.

"Claudio", diz o maestro, "é a primeira vez que trabalhamos juntos, então quero te dizer uma coisa…você não tem nenhuma obrigação de gravar as músicas no primeiro take".

Tiraram o piano de cima de mim, e continuei a gravação muito mais tranquilo.

O mito do primeiro take ainda seduz muitos músicos, principalmente aqueles que estão começando, que o interpretam como sinônimo de qualidade. Infelizmente, a busca sem critério tem feito muito músico deixar alguns "pecados" sem correção, somente para dizer "gravei tudo de primeira".

Pude presenciar essa aberração há uns anos atrás, quando gravei com um baterista de "primeiro take a qualquer custo", e foi bem chato. Houve algum desencontro entre baixo e bateria? O cara terminou de gravar, levantou e foi tomar café, não em uma ou duas músicas, mas praticamente em todas elas.

Então eu pedia para refazer os pontos, como se o erro fosse meu. Mas, depois da 3ª ou 4ª música, comecei a perder a paciência e pedir para refazer porque a bateria estava tocando outra coisa, para ver se o cara se ligava. Isso só foi acontecer lá pelo final do CD, com um "se você quiser eu regravo essa parte", com muita má vontade.

O que é melhor, o primeiro take, ou um ótimo take? Deixar os "pecados" serem perdoados pelo São Pro Tools? Se o melhor take for o primeiro, ótimo, mas se não for, é responsabilidade do músico regravá-lo quantas vezes for necessário, com a mesma disposição e energia da primeira vez. Algumas músicas precisam de mais tempo para se criar uma linha coerente, e não é vergonha para ninguém (pelo contrário), investir tempo para achar um idéia que satisfaça o arranjo.

E para não nos esquecermos: somos humanos, não máquinas. E somos músicos, não pasteleiros.

Abraço,

Claudio

Comentários

Pois é Mestre Claudio Rocha......Pastel sai na hora.....uma boa execução demora um pouquinho mais..........
pois é... conheço "maestro" que por conta de ser um trabalho mais em conta diz o seguinte: deixa assim mesmo é trabalho barato! eu com o peso nas mente digo: ...posso refazer e melhor... ele retruca: assim está bom! tudo para a gravação de bateria não passar de 2-3 horas(só batera)rs... resultado; para o próximo o clinte procura outro!
Claudio Rocha disse…
Adair, meu amigo, é por essas e por outras que gosto de você… precisamos marcar outro queijo e vinho… abs!!!
Claudio Rocha disse…
Felipe, infelizmente é isso mesmo que acontece por aí… abs!!!

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