Careiro…

(Imagem: http://falacanguaretama.blogspot.com)
Há algumas semanas atrás, na hora do café no meio de uma gravação, estava conversando com um dos músicos a respeito de um trabalho que me havia aparecido.

A pessoa que me chamou para o trabalho, em determinado momento, começou a falar sobre o cachê com um cuidado muito grande: "eu sei que você é músico top", "o cachê não é nenhuma maravilha", "desculpe", foram algumas coisas que me disse antes de falar o valor. Mas quando ele me falou… o cachê era bom. Tudo bem, não era o valor da tabela da OMB, mas era um bom cachê.

Quando estava relatando esse episódio para meu amigo, ouvi dele: "é que você tem fama de ser careiro, já ouvi falarem isso".

Fui com isso para casa e, depois de pensar um pouco, resolvi escrever um pouco sobre o assunto.

Analisando um pouco a questão, o mais importante é saber negociar com parâmetros razoáveis. Por exemplo, sempre peço o valor da tabela da OMB para fazer um trabalho. Alguns pagam, outros negociam, e aí começa o braço-de-ferro. Posso não ser o mais baratinho dos músicos, mas nunca fujo de uma negociação, nem que tenha que recusar o trabalho por causa da grana.

Uma coisa a ter em mente é que, dependendo do cliente, uma negociação mal feita (de sua parte) pode significar em uma série de trabalhos recebendo pouco. Apesar de vários usarem o seguinte argumento: "esse trabalho tem pouca grana, mas os próximos serão melhores", uma minoria faz isso efetivamente. O raciocínio é o seguinte: "se ele topou a empada sem azeitona, isso significa que, quando houver a azeitona, posso ficar com ela para mim".

Como disse várias vezes, hoje estou em uma posição confortável, pois meus clientes regulares são pessoas confiáveis, sei que sempre pagam o máximo possível. Mas não sou cego com relação ao mercado como um todo, até porque essa negociação faz parte do jogo. Produtores que cobram um pacote fechado pela produção ("x" mil reais por uma música pronta, com músicos, backing vocals e mixagem inclusos) muitas  vezes tentarão lucrar o máximo e, não se engane, se possível sobre o cachê dos músicos. Por isso muita gente discrimina os itens da produção ("x" para o valor da produção, "y" para o arranjo, "z" para músicos, etc), pois é uma maneira mais clara de trabalhar.

Saber ser flexível é uma arte à parte, mas precisamos ter parâmetros de negociação: cobrar um valor para um trabalho e 15% desse valor para outro parece bizarro, mas existem músicos que fazem isso. O mercado não é grande o suficiente para que essas coisas passem desapercebidas, as pessoas comentam… imagine um produtor que lhe pagou um ótimo cachê, sabendo que você gravou com outro produtor por uma porcentagem ínfima daquele valor… espere uma super negociação quando for gravar de novo com ele…

Outro ponto importante é saber quando subir seu valor. Músicos no começo de carreira obviamente irão cobrar cachês menores. Mas, à medida em que melhoram seu currículo, é esperado que subam seus preços de maneira coerente. Infelizmente, não é isso que acontece com alguns deles, aumentam o preço mas continuam aceitando trabalhos do tipo "empada-sem-azeitona", até para não deixarem novos músicos aparecerem.

Não gosto de julgar as motivações,  pois cada um sabe "aonde aperta o calo", e um discurso sobre cachê pode ser bem indigesto quando você vê suas contas atrasadas. Mas, como diz um grande amigo, em horas de aperto, a sinceridade é a melhor arma: "Esse não é o preço que cobro, mas preciso pagar umas contas atrasadas, então, dessa vez irei aceitar esse cachê. Hoje foi seu dia de sorte". Algumas vezes, ser explícito é a melhor maneira de lidar com o abuso.

Saber valorizar-se é tão importante quanto saber ser flexível. Tenho aprendido a me equilibrar nessa corda-bamba, por vezes caio, mas outras vezes me equilibro e consigo dar alguns passos à frente. Como disse, essa é uma arte à parte… mas, sinceramente, antes ser chamado de careiro, do que de baratinho…

Abraço,

Claudio

Comentários

Peti disse…
Claudião, muito bom. Isso é negociação, e acontece desse jeito sempre que há um contratante e um contratado - seja na música, na construção civil, na feira livre, etc... Admiro o seu equilíbrio e auto-valorização nesse aspecto! Afinal de contas, se a gente não se valorizar... quem fará isso por nós?

Abs, amigo!

Peti
Fá Mendonça disse…
Acho que o mais difícil de tudo isso é saber se valorizar corretamente. Flexível a maioria é justamente por causa das contas atrasadas, mas junto com essa flexibilidade vai a desvalorização pessoal e profissional. Tudo isso faz com que os contratantes chamem de "careiro" alguém que cobra um valor TABELADO!

Excelente texto, Claudião. Leitura recomendada a qualquer músico.

Postagens mais visitadas