Que Cenário Te Espera?

Por ser um músico que começou a carreira muito tarde (comecei a gravar no final da época dos Adats), adoro conversar com os mais experientes, e poder entender como as coisas funcionavam nos anos de ouro do mercado musical.

Gravações quase todos os dias, com cachês bons, algumas vezes cobrados por hora, vários programas de TV com músicos tocando, partituras bem escritas, gravações na fita de rolo, onde todo mundo tocava junto, shows com tabela mínima, porque artistas pagavam 2 ou 3 tabelas para os músicos. Até os músicos "meia-boca" tinham trabalho, simplesmente pelo fato do mercado borbulhar, e o dinheiro correr solto nas produções.

Assisti uma entrevista com o lendário baixista Neil Stubenhaus (está aqui no blog), onde o entrevistador pede para que ele dê um conselho aos músicos iniciantes. Sua resposta começa com: "você quer que eu seja bonzinho ou honesto?", e começa a descrever o mesmo cenário que citei acima, do final dos anos 70 até o começo de 2000.

Esses tempos acabaram.

Não quero desanimar os músicos que estão começando, somente dar um panorama do que está acontecendo, porque uma visão realista é necessária nesses tempos malucos. Também não estou dizendo que não existam mais gravações com bons cachês, ou programas de TV usando músicos, somente que a realidade do dia-a-dia não é mais essa.

Músicos tocando com artistas famosos por cachês baixíssimos, gravações com quase nenhum dinheiro (cansei de escrever sobre isso), produtores que não produzem, arranjadores que não sabem escrever uma cifra, e músicos que não conseguem tocar no beat e são arrumados no computador, isso é algo mais parecido com os nossos tempos. Nunca cheguei a ouvir falar em tabela mínima, mas em meia tabela, e hoje não se fala mais em tabela da O.M.B., isso é coisa das "antigas".

O dinheiro não foi embora, simplesmente migrou para outras áreas: jabá em rádio e TV, divulgação de todas as maneiras, fazer o maior número de pessoas ouvirem o hit do momento, custe o que custar. Essa lavagem cerebral custa muito dinheiro, e as gravadoras estão dispostas a gastá-lo. Agora, se o artista vai em algum programa de TV, obviamente está pagando, mas não quer mais pagar os músicos, porque está fazendo divulgação. Uma nova modalidade teve início a uns anos atrás: se o músico recebe quando toca em programa de TV, vai receber pela quantidade de músicas, porque o artista não faz um show completo, canta apenas um par delas. Claro, não se leva em consideração o número de horas que o músico ficou à disposição do trabalho, mas para quê levantar esse assunto, é divulgação e o músico tem que "vestir a camisa". Porque você sabe, tem uma tonelada de outros músicos querendo pegar a sua gig

Caso parecido acontece em gravações. Como o mp3 e a pirataria digital bagunçaram o coreto, alguns artistas gravam um CD sem o mínimo intuito de vendê-lo, mas distribuí-lo como divulgação para fazer shows. Então, para quê gastar muito para fazer um CD? Chute um cachê baixo, tem um monte de músico bom começando, eles irão topar. E existem alguns mais experientes e conhecidos que também topam, até para não deixar os mais novos entrarem no mercado. Se o "medalhão" topa, paga-se um cachê de novato sem a preocupação com falta de experiência. Ah, claro, não dá para pagar um cachê melhor porque depois eles terão que pagar um monte de grana para as rádios tocarem seus hits.

Mas não existem somentes nuvens escuras na fotografia, ainda existe um cenário bonito. Artistas fazendo boa música, com shows algumas vezes lotados, CD's bem produzidos e bem tocados, gravados em estúdios onde o técnico de som sabe que treble significa agudo, e com cachês melhores do que a média. Podem não ser a maioria, mas existem, e é algo que nunca irá desaparecer, porque as pessoas têm gostos variados, umas gostam de R&B, outras de sertanejo, outras de música clássica, e por aí vai. Duvido que chegará um momento em que todas gostem do mesmo estilo, mas se isso acontecer, prometo que escrevo outro post, bem mais apocalíptico, ok?

Abraço,

Claudio

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